All of nothing: Manchester City, disponível na Amazon Prime revela um pouco dos bastidores da histórica campanha do técnico espanhol em seu segundo ano no time inglês
Recentemente assisti a série/documentário All or nothing: Manchester City. Que acompanha o time inglês durante a temporada de 2017/2018, quando conquistou o seu quinto título da Premier League, sendo o primeiro clube a superar o barreira com 100 pontos. O início dessa trajetória vitoriosa começou um ano antes com a contratação do treinador Pep Guardiola, vindo do Bayern de Munique. Ele comandou uma revolução no modo de jogar futebol do clube que exigiu uma enorme transformação para os jogadores. A série entrega um pouco dos bastidores sobre o modo que Guardiola usa para comandar sua equipe e os movimentos que o clube fez para adaptar investimentos e estratégia à forma de pensar do treinador.
Apesar de breve, apenas 8 episódios de, em média 45 minutos, o passeio entre vestiários, palestras de preparação para os jogos, viagens e reuniões da direção é bem imersivo, e permite tirar alguns insights sobre como é feito um clube vencedor.
Planejamento e estratégia:
Apesar da série acompanhar a parte boa da história, é importante contextualizar que o primeiro ano de Guardiola no City não foi nada empolgante, com a equipe inglesa terminando em 3º lugar no campeonato, caindo nas oitavas de final da Champions League e não erguendo nenhum título. Mas conversas entre dirigentes e equipe técnica sempre revelavam investimentos focando no longo prazo e acompanhamento próximo do desempenho do time. Eles tinham um caminho claro a seguir.
Diagnóstico e confiança:
A primeira grande movimentação foi a contratação de novos jogadores, o principal ativo do time. A equipe técnica de Guardiola orientava e indicava as peças e os dirigentes corriam atrás das questões financeiras e tributárias. Destaca-se a tomada de decisão coletiva, em consenso de todas as partes e a velocidade na execução, uma vez que se tratam de negócios milionários e longos contratos.
Convicção nos métodos
A série vai decepcionar a todos aqueles que esperam discursos motivacionais e de encorajamento. Em certo ponto as palestras de Guardiola chegam a ser repetitivas. Ele conhece como ninguém seu modelo de jogo e sua única missão é convencer os jogadores de que aquele é o caminho a ser seguido. Não é uma questão sobre aquela ser a escolha certa ou errada. Naquele momento, aquele era o caminho escolhido.
Compromisso com a causa
Em certo momento, o treinador deixa claro também que ninguém é obrigado a fazer nada do que pedir e nem mesmo a ficar no clube, podendo pedir transferência. O que ele quer com essa fala é dar senso de compromisso e responsabilidade com a causa. Esse discurso é primeiramente alinhado com a direção do time, que segue fazendo os investimentos e visando um projeto de longo prazo e que agora, compartilha essa responsabilidade aos jogadores. Para eles, a mensagem é clara, haverá prioridade e preferências para aqueles que melhor absorverem e se conectarem com o novo modelo de jogo.
Alta performance
Guardiola é um workaholic. Sua vida é viver em torno do futebol. Essa é a maneira como ele alcançou a suas conquistas e é a forma como ele conduz seu trabalho. Para seus liderados isso significa que sempre, em todo o momento, seja treino ou jogo, o máximo empenho e dedicação.
E é interessante notar os motivos que ele encontra para transmitir aos jogadores justificativas para dar o algo a mais. Até mesmo quando o time já havia sido campeão com cinco rodadas de antecedência. E a questão é simples: ele sempre quer ver o melhor em campo, independente contra quem e valendo o que. O time vencedor não se tornou campeão após erguer a primeira taça, ele foi feito a cada jogo com o pensamento de evolução constante. No contexto de um time de futebol, Guardiola é o líder responsável por nunca deixar esse desejo de evolução constante se apagar.
Menos genialidade e mais trabalho em equipe
A série serve também para derrubar a aura de genialidade de Guardiola. Mas isso não é um demérito ao treinador, que tem toda a responsabilidade e mérito pelos títulos que conquistou. Mas é gratificante notar que para chegar aonde chegou ele se cercou de pessoas igualmente talentosas e que tinham os mesmos conceitos em mente. Ali vemos a figura do professor com um olhar mais tático, do confessor, do estrategista. E quando todos se juntam, temos o modelo de jogo de Guardiola.
Gestão de equipe
Até onde vemos a gestão de Pep se faz por meio de um modelo de liderança baseado no exemplo. É difícil para qualquer jogador confrontar todos os títulos conquistados na carreira, tanto de técnico, quanto de jogador de Guardiola. Esse histórico valida cada palavra dita por ele e traz confiança ao grupo, fazendo-o abusar de frases como “eu sei como é”; “eu já passei por isso”; “eu sei o que você está sentindo”; “eu já estive no seu lugar”.
O tom de Guardiola, apesar de extremamente obstinado por performance, não ultrapassa o limite do tolerável. A exigência do treinador é enorme, mas nunca a ponto de tornar-se tóxica ou ofensiva.
Claro, é sempre bom ressaltar que estamos acompanhando um recorte de uma realidade, que pode não significar ela como um todo. Mas acredito que os ensinamentos acima mapeados são pontos que valem para qualquer realidade que busca um desempenho em alta performance. Há algum tempo li o livro Liderança, de Michael Moritz, sobre a carreira do ex-treinador e multicampeão pelo Manchester United, sir Alex Ferguson, e vi em Guardiola essa mesma ambição por vencer e evoluir sempre.
“Grandes líderes são competitivos não em relação aos outros, mas à ideia da própria perfeição."
Moritz encerra o livro com o seguinte comentário a respeito de Ferguson: “Grandes líderes são competitivos não em relação aos outros, mas à ideia da própria perfeição. Não importa quantos recordes de vendas tenham conseguido, quantos concorrentes tenham eliminado ou quantos produtos sensacionais tenham criado: eles sempre almejam uma versão maior e mais perfeita do seu sucesso”.
Guardiola é considerado como o maior técnico em atividade, e que revolucionou o esporte com seu Barcelona de 2008. Ferguson, por muitos, é o maior treinador da história. O que ambos compartilham, além do respeito mútuo pelas suas histórias, é essa incessante busca pela perfeição, e de melhorar cada dia um pouco mais.
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