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Roberto Bolaños

Chaves: 
- Uma vez eu vi um gato com um olho só
Seu Madruga: 
- Era cego?
Chaves: 
- Não
Seu Madruga: 
- Então por que viu o gato com um olho só?
Chaves: 
- Porque eu tapei o meu olho esquerdo

------------

Seu Madruga: 
- Kiko, você está falando com o regador?
Kiko: 
- Parece um regador não é? Só que não é.
Seu Madruga: 
- Então o que é?
Kiko: 
- É um cachorro
Seu Madruga: 
- Olha Kiko, diga para a sua mãe que na salada a gente coloca vinagre e não cachaça.


A primeira lembrança que me veio a cabeça quando soube da notícia foi do meu avô. Chapolin e Chaves, eram os programas favoritos dele. Quando voltava do trabalho, no final da tarde, antes do Jornal Nacional, o SBT era imbatível na audiência lá em casa.
Ele já tinha visto todos os episódios, sabia de cor todas as cenas, mas não importava, o riso sempre estava lá, seguido das gargalhas e dos comentários: “Olha lá, vai apanhar de novo!”, “Quer ver ele se dar mal?”, “Mas é burro esse Chapolin”. E eu assistia junto, e ria igual, do mesmo jeito. Talvez fossem os únicos programas que assistíamos e nos divertíamos juntos. Jogo do Inter ou do Grêmio não valia porque ali a rivalidade pegava.
O interessante é que os bordões dos programas ás vezes saiam da tv e iam para a vida real. Não era raro ouvir ele dizendo “não contavam com a minha astúcia”, ou “é que me escapuliu” no dia a dia.
Acredito que para um artista, chegar ao ponto de unir duas gerações separadas mais de 60 anos pelo humor seja sua maior façanha. Bolaños tinha isso, e era essa simplicidade e ingenuidade de Chaves e Chapolin que o faziam universais. Ainda hoje seus textos divertem e comovem fãs de todo o mundo.
Mesmo trabalhando com cenários de papelão, efeitos visuais horríveis e figurinos bregas, Bolaños tinha consigo dois fatores difíceis de se copiar: sua genialidade e criatividade sem limites. Isso, aliado a um elenco impecável construíram uma obra imortal, que levará muitos anos para se apagar.
Bolaños não era um gênio por trás das câmeras, não criava histórias fantásticas, não brincava com metáforas e nem se preocupava em contar a história junto com o espectador. Ele era puro e simplesmente divertido em sua forma de ser. Meu vô adorava pois o programa tinha uma linguagem visual muito viva, e facilitava muito para ele, devido ao seu problema auditivo. Eu pirava com as aventuras do Chapolin, tinha medo dos duendes e saia cantando “thuinthuinthunclain” na escola. Para outro, poderia ser as piadas secas e simples, os bordões impagáveis, as expressões do seu Madruga, os vilões do Chapolin, as férias em Acapulco... o que seja, Chaves e Chapolin agradavam a todos, não importando raça, idade ou classe social.
No fim da vida meu avô foi acometido por uma doença que o deixou debilitado por anos. Ele passava quase todo o dia na cama. Lembro uma vez que ele sentou na sala para ver tv, era horário do Chaves então troquei de canal e sintonizei o SBT. Mas nos poucos minutos que ficou ali, ele não ria mais, a dor era tão forte que logo depois levantou-se e voltou para o quarto. Reclamava em lágrimas “nem mais o Chaves eu consigo assistir...”, e voltou para a cama.
Bolaños fez o mesmo este final de semana, aposentou o uniforme vermelho e roupa cinza costurada. Com certeza o céu ficou muito mais animado, e meu avô finalmente vai se encontrar com aquele que, sem querer, querendo, o fez rir muito e deixar seus dias mais leves e divertidos.





R.I.P

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