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Minha visão sobre Interestelar



Definitivamente Interestelar foi um filme que mexeu comigo. Posso contar nos dedos as obras cinematográficas que me fizeram passar dias lembrando e relembrando, vendo e revendo. Em sua grande maioria foram clássicos, feitos para levar emoções e questionamentos ao leitor. Acredito que o último filme que tenha me colocado em uma situação de persistentes questionamentos foi “Amor”, filme francês de 2012 vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro. Uma experiência “horrível”, no melhor sentido da palavra, saí arrastado do cinema, carregado com o peso dos protagonistas e muitas reflexões.
Interestelar não é um clássico, não foi construído para isso. Acima de toda a física e ciência aplicada, ele é um blockbuster, feito para arrecadar dinheiro, e como mostram seus resultados, conseguiu isso perfeitamente (US$ 150 milhões em novembro nos EUA). Vendido como filme “cabeça”, de difícil compreensão, Interestelar não tem nada de complicado, sua história é uma só, com um roteiro didático (exagerado, mas a meu ver, necessário), mas que leva o espectador a uma viagem cósmica que ultrapassa os limites das galáxias (literalmente) e do seu próprio pensar. E aí acredito estar o que mais me prendeu no filme.
Antes de Interestelar, dois filmes me propuseram sensações semelhantes: 2001 – Uma Odisséia no Espaço, de 1968 – que ainda persiste no topo da minha lista de melhores filmes -, e Solaris, clássico do cinema russo com 166 minutos de duração e muita filosofia. Guardadas as gigantescas e devidas proporções, e com o adendo de que qualquer assunto que envolva astronomia já tem a minha total atenção, a avaliação positiva de Interestelar se dá justamente pelo que os três filmes conseguem fazer perfeitamente: ultrapassar barreiras que daqui na Terra se resumem em teorias, arduamente estudadas, porém nunca comprovadas.



Depois de um primeiro ato recheado de explicações e da concepção do sentimento de afeto para com os protagonistas da história, a viagem além-galáxias que inicia no segundo ato começa a estabelecer um clima de suspense e aventura que se mantém por quase todos os 145 minutos do longa. Mesmo com uma direção que avalio como falha em acompanhar a viagem da Endurance pelo espaço, - com câmeras estáticas junto as naves ou um não aproveitamento do fator gravidade -, o diretor Christopher Nolan nos brinda com cenas fantásticas, como o passeio da nave pelo infinito espaço no mais profundo silêncio. É uma pena que este mesmo silêncio que encanta, faz falta em vários outros momentos em que somos inundados pela trilha de Hans Zimmer, que apesar de incrivelmente bem composta, não respeita momentos em que o silêncio poderia trazer melhores efeitos. Desastrosa também é a mixagem de som, nitidamente abafando voz com trilha ou vice versa.
Com a entrada da nave no buraco de minhoca, a sensação é que embarcamos junto aos tripulantes rumo ao desconhecido. O deslumbre com toda a direção de arte e efeitos para “criar” o ambiente de doze planetas e de um gigantesco buraco negro é de tirar o fôlego, assim como as visitas aos planetas lá existentes e a própria estação espacial e as roupas dos astronautas, que mesmo com um estilo retrô e ultrapassado – acredito que pelas dificuldades financeiras que a NASA enfrentava no contexto da trama – passam uma sensação de épico ao filme.
Também é curioso notar que mesmo com toda imensa novidade visual nunca antes vista pelos tripulantes e pelo telespectador, a cena que representa todo o filme é uma câmera fechada focando um pai que olha as mensagens de seus filhos em um computador, e a utilização da teoria da relatividade de Einstein como um intenso fator emocional.
Já o terceiro ato do filme parte para ligar todos os pontos apresentados a uma conclusão e criar uma polêmica que dividiu a crítica mundial. O filme então brinca com o tempo, transformando-o em uma dimensão física, e o espectador não tem outra alternativa senão seguir a lógica apresentada por Nolan. De minha parte não me deti ao detalhe imposto pelo diretor, optei por digerir sua conclusão e deixar que o clima interestelar – foi mal o trocadilho – reinasse.
O filme todo foi uma ode à ciência e a física, desde sua cena inicial – totalmente spielberiana – com pai, filho e filha caçando um drone perdido, à ressurreição da NASA como salvadora do mundo, aos astronautas heróis e ao discurso de Cooper defendendo as missões Apollo ao ouvir que as escolas vendem às crianças a ideia de que a viagem a Lua foi uma propaganda de marketing para falir a União Soviética. Interestelar faz com isso renascer uma paixão sadia ao desconhecido, ao que existe fora do planeta Terra ao quão somos insignificantes diante tudo que existe Universo afora.

É curioso notar que o filme entrou em cartaz semanas após o ser humano ter feito a sonda espacial Philae viajar seis milhões de quilômetros, durante dez anos e pousar suavemente na superfície de um cometa. É absurdo imaginar o tão complicado e notável foi esta missão, que busca no cometa, respostas para o surgimento da vida na Terra. O detalhe é que no mesmo dia em que a Philae pousou no cometa, o assunto mais comentado no mundo foi o ensaio sensual que Kim Kardashian fez na internet. Essa é a humanidade, mais humana do que nunca.


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