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Sobre casamento, felicidade e amor

Sempre fui um apaixonado por décadas passadas, adoraria ter vivido nos anos 20, 30 e acompanhando a evolução da sociedade até onde chegamos hoje. O modo de viver, os costumes, a cultura pareciam tão simples e charmosos diante do que vivemos agora. Depois de assistir a “Meia noite em Paris” de Woody Allen, me dei conta de que somos atraídos pelo mundo que não tivemos. A nostalgia, por assim dizer, é corriqueira e é um sentimento comum a todos. Podemos perguntar a qualquer um sobre sua infância que a resposta será a mesma: “Háaa, as crianças de hoje não sabem o que era diversão” ou “no meu tempo sim, que era divertido”! Falo por mim, agradeço por ter uma infância na rua, diferente das atuais crianças, presas em apartamentos e de frente a vídeo games ultramodernos. Porém é inútil dizer que a minha infância foi melhor que a delas. Cada um teve suas alegrias datadas da época em que viveram. Se tivessem me posto um vídeo game de hoje comigo em 1995, tenho certeza que preferia mil vezes jogar bola na chuva. Do mesmo modo, ensinar taco a um pirralho de hoje é perda de tempo! 
Enfim, a introdução sem contexto serve para falar da evolução da humanidade, de seus costumes e do que a sociedade se tornou. Voltando ao início da história, minha nostalgia por décadas passadas acabou não apenas pelo filme, mas também por observar outros costumes que, se impostos hoje, seriam levados a vara criminal e julgados por crime contra a vida! Um exemplo? A instituição familiar, ou sendo mais específico, o início dela, o casamento! Nas décadas citadas acima, era natural a família escolher o esposo ou a esposa para seus filhos. Um casamento era, principalmente, um jogo de negócios, em último lugar ficava o sentimento de um pelo outro. As mulheres então, se reservavam a um homem – escolhido por terceiros – para o resto de sua vida. A opinião da mesma era o que menos importava. Mulher nasceu para servir ao marido e este, por nascer homem, tem a liberdade de ter para si sua esposa, mulheres da vida quando quiser e, caso a esposa não cumprisse com os acordos matrimoniais, abandoná-la e buscar outra.
Por incrível que pareça, não falo aqui de um assunto dos tempos medievais. Falo de uma sociedade que já havia inventado o avião, a máquina a vapor e a eletricidade. Esta mesma civilização tratava o casamento desta forma, um negócio, um acordo entre compadres.
Felizmente os tempos mudaram. Hoje podemos nos considerar uma sociedade evoluída (?), ciente de nossos direitos, com leis mais justas e os direitos humanos sempre que possíveis ditando novas reformas e quebrando preconceitos. É difícil acreditar que ainda hoje, menos de cem anos depois, ainda tenhamos casos como este em nossa sociedade. Não da mesma forma, suavizados, mas mesmo assim impostos. De todo modo tivemos evoluções!
Voltamos ao casamento! Este passou de uma imposição da família para uma opção dos noivos. Depois da revolução feminista, as mulheres ganharam seu tão sonhado papel na sociedade. Hoje no nível profissional, mesmo com alguns preconceitos ainda vivos, competem de igual para igual com os homens. Na família, a visão da mulher dona de casa, submissa ao marido acabou! Hoje os dois dividem as mesmas tarefas. Finalmente, homem e mulher podem optar, escolher a pessoa com quem querem viver o resto de suas vidas, sem interferência ou pressões externas. Hoje decidir com quem se casar é uma decisão isolada, ou melhor, uma decisão conjunta, entre homem e mulher! E só! Aí que entra na rotina da sociedade uma palavra tão sonhada, tão esquecida e tão confundida por muitos: a felicidade!
Hoje temos esse direito! Ainda não em lei, mais em projeto! O senador Cristovam Buarque, do Distrito Federal criou uma PEC para estabelecer a busca pela felicidade como parte da Constituição Nacional e direito de todo o brasileiro. No início refutei sobre a ideia – um tanto quanto superficial – mas hoje concordo plenamente. Temos uma única vida conosco e nada, nada mais é importante nela do que a nossa própria felicidade! É meu direito busca-la e tê-lo imposto em lei, não simboliza apenas um dizer, mas um propósito de vida.
Visto isso, volto ao casamento! E volto a questionar a importância dele nos dias de hoje. Acredito ser um resposta muito pessoal de cada um, mas vamos lá. Para mim, um casamento é um ato de união entre duas pessoas que prometem amor eterno e mútuo pelo resto de suas vidas. Acredito ser uma das decisões mais difíceis da vida, dedicar seus dias a outra pessoa e compartilhar com ela alegrias, tristezas, conflitos e emoções. Conversando com uma amiga, ouvi que casamento é vocação, que nem todos tem esse dom, de se doar ao outro para constituir, a partir desse laço, uma família embasada no amor e na fidelidade. Achei incrível, e concordo plenamente. Juntando as duas ideias, eis minha conclusão: casamento é a comunhão entre amor e felicidade. Apenas com esses dois sentimentos sendo recíprocos é que um matrimônio enfim pode se concretizar. Caso contrário, voltamos aos anos 20, de uma sociedade primata que via a relação e o sentimento entre duas pessoas algo inferior a status e nível hierárquico.
Infelizmente ainda alguns resquícios dessa antiga realidade tomam forma nos tempos de agora. Hoje casamento virou obrigação, principalmente para as mulheres, que tanto lutaram pela igualdade dos sexos. Infelizmente essa pressa em encontrar alguém ideal acaba se afrontando com as duas máximas do matrimônio, amor e felicidade! Sem eles não existe casamento, não existe família, não existe tolerância. Para o amor e a felicidade não existe hora nem local para acontecer. Infelizmente nem todos tem a paciência de esperá-los ou encontrá-los e acabam se conscientizando com o que conseguiram momentaneamente. Ai entra o paradoxo das últimas décadas: nunca tivemos tantos casamentos constituídos pelo amor entre duas pessoas... e nunca tivemos tantos divórcios! 
Defendo até a última gota que o divórcio nunca deveria existir. Mas se ele existe, vem de um casamento mal estruturado, ou apressado, ou não partilhado. Uma relação só acontece quando ambas as partes tem sentimentos mútuos um pelo outro, não adianta um querer e o outro ceder, de duas uma: ou o primeiro se desilude ou o outro desiste.
O divórcio é então uma criação humana, vinda muitas vezes da mal interpretação de sentimentos, em confundir obsessão por amor, comodismo por felicidade, paciência por parcimônia. Ele é resultado da confusão em achar que existe data para casar, no medo de perder alguém ou de não acreditar que a vida sempre pode surpreender.
O que muitos não compreendem é que o casamento, mesmo constituído de dois seres, interfere na vida de outros, pequenos seres que estão por vir e que serão os mais atormentados na história. Um casamento que começa sem base no amor não perdura, não se sustenta, acaba recaído nos filhos e no futuro deles. A consequência disso, os traumas, a personalidade mal formada, a superproteção, a carência da figura do pai ou da mãe, a psicologia pode muito bem explicar!
  As artes, o cinema, os livros, os contos de fadas, sempre mostraram uma visão idealizada do casamento. Muitos confundem que a história do príncipe e da princesa é utopia, que não existe na vida real e que deve ser ignorada, que é uma ilusão. Discordo em partes. Todo o tipo de arte no mundo foi construída por mãos humanas, ou seja, por detrás daquela história existiu alguém que a idealizou, fez seus desejos tornarem realidade, ao menos na sua fantasia. Contos de fadas não são mesmo para serem seguidos, copiados, mas sim para acreditar, dar fé, para fazer deles, um propósito para a sua. 
Propósito este que se resume em encontrar e ter consigo alguém para compartilhar a sua vida, e não simplesmente viver uma vida juntos. Por utopia, me vem à cabeça uma música que ouvi muito na minha adolescência e que resume o que se espera da relação entre duas pessoas. Em seus versos, o filho fala do amor que encontrava na sua família, vindos da relação harmoniosa de seus pais. No fim, desabafa sobre a falta de amor nos tempos de hoje, citando o divórcio como resultado de tudo isso! Dentre seus versos, me marcaram estes: “faltava tudo, mas a gente nem ligava, o importante não faltava, seu sorriso e seu olhar!”. Talvez forçando demais a tradução, mas conto de fadas para mim é isso, um sorriso e um olhar para todos  os dias. Fico triste pelo nome da música ser “Utopia”, algo inalcançável, que talvez desperte em outros a desistência dessa vontade. Muitas vezes é difícil, mas nunca utópico. Muitos confundem e consideram a felicidade do conto de fadas uma utopia. Enganados. A felicidade está nas pequenas coisas, assim como diz a música, em um sorriso ou em um olhar! Não precisamos de muito para ser feliz, apenas isso, o essencial da vida. A vida é simples, nós que complicamos ela. Entre o conto de fadas e a vida real, qual frase soa melhor: “até que a morte os separe” ou “felizes para sempre”? Para muitos, utopia, para outros, propósito de vida.
Como dito anteriormente, casamento é vocação, é algo sagrado e único! Não é simplesmente um jogo de dados, uma tentativa que tem a obrigação de dar certo! Se a instituição familiar vem mudando com a sociedade, o casamento também está. E não existe união entre duas pessoas sem amor mútuo. Sem isso a base não é montada, os alicerces não sustentam e os frutos tendem a decair.
Deus não criou o divórcio, concordo. Mas as regras dele para o casamento também foram mal entendidas por nós. Para Ele de nada tem a ver status, condição financeira, cor ou raça. A maior dádiva que Deus pode conceder a nós é a oportunidade de encontrar o amor e a felicidade. Até esse momento chegar é provável que muitas desilusões ou erros possam aparecer no caminho, porém ela sempre chega, cedo ou tarde, longe ou perto!  Até esse momento chegar não existe o consentimento de Deus, pode existir o de um padre, rabino, pastor, que seja, mas se Ele não consentir, não há sentido em seguir em frente!
Casamento é a base de uma família, e uma família não se constitui sem amor e afeto. Todos sabem o quão é difícil encontrar a pessoa ideal, a qual possa compartilhar planos, sonhos e desejos. Mas nem todos sabem que se não encontrada, ninguém vai substituí-la. Não existe peça de reposição, amor é um sentimento único, é doação pela outra pessoa, é querer fazer que os dias dela sejam melhores que os seus. E quando isso é mútuo, ai sim, temos um casamento! Casar é unir duas pessoas em uma só! E sem amor não existe união, sem amor não existe felicidade, apenas uma vida de ilusão, forçada, insistida, sem sonhos, sem desejos, sem futuro. Amor é compartilhar uma vida, e vida sem amor, não é vida!



Comentários

  1. Curti curti!!! Acho as épocas passadas mais "glamourosas", no sentido de que as pessoas não andavam com tão poucas roupas, nem escutavam qualquer tipo de "música" na rua.. ah sei lá... eram mais contidos, inclusive os sentimentos né... o negócio é viver este momento, pois não podemos aproveitar o que já passou, nem sabemos o que está por vir!!!! :-P

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