“Não acredito que VOCÊ ouve isso”! Essa é a frase que mais
escuto quando afirmo que escuto um dos estilos musicais brasileiros com mais
preconceito no país. Nesse breve texto talvez surja uma justificativa para
minha escolha.
Antes de tudo, deixo claro que não quero colocar nessas
linhas nenhum embasamento teórico ou musical sobre o ritmo, melodia, letras,
etc. Música para mim, na maioria dos casos, representa um estado de espírito,
arte, sensação, sentimento. Levo a sério o que ela me transmite, o que sinto
quando a escuto e o que o artista transmite quando a canta. Talvez por isso
deva dizer que antes de um fissurado por samba e pagode, tenho paixão maior
pela música clássica, das sinfonias lindíssimas de Chopin a Debussy. Me encanto
com as composições de Chico Buarque e Vinícius de Moraes, sinto a nostalgia e a
energia do pop rock nacional, de Engenheiros do Hawaii a Skank, não troco o meu
rock por nada, de Beatles a Black Keys e não existe nada mais dançante que um
bom som eletrônico, de Guetta a NTFO. Enfim, não existem gêneros musicais
ruins, existe sua percepção e sentimento sobre eles, e no meu caso, por sorte,
me simpatizo por muitos deles.
No caso específico do pagode, e aí acrescento também o
samba, tenho convicção de que não existe gênero que expresse da melhor forma o
jeito brasileiro de encarar a vida. E por jeito brasileiro, não entendemos o
“jeitinho brasileiro” mais sim a nossa forma de viver, da qual é tão inferiorizada
pela sociedade e também pela mídia. Tenho comigo um perfil desse jeito
brasileiro e acredito que o samba e o pagode, como nenhum outro ritmo, expressem
ele em suas letras e melodias. Não é uma unanimidade, sei que em certos pontos
eu mesmo não encaixo nele, mas acredito ser da grande maioria: brasileiro é um
ser alegre por natureza, que carrega consigo a carga histórica, de uma terra
ocupada por desfavorecidos europeus e sucessivos governos despreparados e
corruptos que a cada mandato menosprezam seu eleitorado e vendem candidaturas
por “bolsa felicidades” de 50 reais por mês. Nada é investido em educação, nada
é investido em cultura, em comodidade urbana, em segurança mesmo com as maiores
taxas de impostos do mundo.
A grande maioria da população brasileiro é das classes C, D
, E, ainda não consigo considerar isso classe média, a grande maioria da
população brasileira acorda cedo, pega um transporte público humilhante e retorna
pra casa quando o sol já esta posto. Grande parte da população brasileira teve
que lutar por seu espaço de terra, grande parte população brasileira não fez
faculdade, estudou em escola pública de um sistema de educação defasado e teve
grande parte da sua educação cívica vinda dos pais, que em sua grande maioria
já vivia os mesmos problemas no seu tempo.
Em resumo, é difícil, senão impossível, para esse cidadão, a
cada quatro anos escolher o melhor nome para os quatro anos seguintes. É
inviabilizado a ele acesso a cultura, a educação de qualidade, ao mínimo de
conforto que um ser humano tem direito. A preocupação para estes não são os 200
milhões desviados, mas sim os R$ 3,50 para comprar o leite no fim do mês. A
preocupação não é a Amazônia sendo desmatada ou a usina de Belo Monte, mais a
próxima chuva que pode derrubar o barraco construído em lugar indevido por
falta de opção.
Apesar de tudo isso, apesar de todos esses problemas que
acabariam com qualquer ideal de felicidade, este mesmo indivíduo vê a vida como
uma dádiva, uma benção de Deus e que, apesar de todas as dificuldades, deve ser
aproveitada ao último instante.
Mesmo com tudo para desanimar, o brasileiro expressa consigo
um sorriso no rosto, um gesto de gentileza, um bom dia empolgado, mesmo dentro
de um ônibus lotado e sem conforto. Somos afetivos por natureza, um povo
hospitaleiro, temos o sangue latino, abraçamos, não apartamos as mãos, expressamos
nossas emoções melhor e maior do que qualquer outro povo, e somos reconhecidos desta
forma. E tudo isso está expresso nas canções de samba e pagode, de Dorival
Caymmi a Thiaguinho.
O pagode e o samba transmitem um jeito nosso de encarar a
vida, apesar dos pesares, somos um povo feliz, que aproveita e sabe aproveitar
a vida. Temos o gingado no corpo, não nos entregamos tão fácil, não fugimos a
luta, mesmo que a luta seja covarde e injusta.
As canções de pagode cantam nosso cotidiano, o que vivemos
diariamente, nossas histórias que adoramos compartilham e exaltar. E de um
jeito e uma animação impar, temos o direito de ser feliz e seremos, mesmo que
vida nos mostre o oposto.
Sou totalmente contra o ostracismo, a ignorância e
principalmente o comodismo. Acredito que se acomodar com o que temos hoje é
abrir mão de viver, de lutar. Uma situação é sempre possível de ser alterada,
melhorada, acrescida. Porém, não confundo isso com ambição (no sentido pejorativo
da palavra) ou ganância. É uma questão particular. Não preciso mais que um
trabalho ao qual eu goste e uma família unida e com amor para ser feliz. Pagode
e samba cantam isso, a luta pela felicidade, do jeito que ela é desejada. Certa
vez me questionei: “Quando você gasta para ser feliz?” Se para muitos uma
mansão e um carro importado representam estar feliz, tenho a sorte da minha
felicidade ter um custo benefício bem mais em conta! Assim como os demais
pagodeiros e sambistas, que encontram ela em uma roda de samba a cada
sexta-feira! Esses dois gêneros representam a alegria e a simpatia única dos
brasileiros, nossa marca registrada e que por nos mesmos é depreciada ou
pré-julgada!
Concordo que o nosso país tem milhares de problemas, mas o
povo não é um deles! Temos amor a um país abençoado por Deus e bonito por
natureza, mas que faz de tudo para deixarmos para baixo. Mesmo assim erguemos a
cabeça, batucamos um pandeiro e rimos da vida. É o que nos resta, rir e cantar,
sambar e dançar, mas sem desistir de ser feliz!
Conselho - Jorge Aragão
Mineirinho - SPC
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