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Qual é a verba de um sonho?


No início desse mês conheci a história de Diana Nyad, uma norte-americana de 64 anos e exemplo vivo de persistência e coragem. Diana é nadadora de longas maratonas e tinha um sonho: aos 28 anos de idade tentou atravessar a nado os 177 quilômetros que separam Cuba da Flórida, nos Estados Unidos. A tentativa acabou não dando certo, depois de nadar cerca de 50 horas, precisou ser retirada da água.
Quando completou 60 anos de idade, Diana retomou seu antigo sonho, prometeu a si mesma que seria a primeira a pessoa a atravessar o estreito que separa os dois países sem utilizar uma jaula anti-tubarões. Foram quatro anos de treinamentos, onde passava de oito a doze horas diárias embaixo d’água. Para manter a concentração, ela decorou uma lista de 65 canções, as quais eram repetidas sistematicamente buscando não pensar em nada além de nadar. O relato que ela escreveu em 1978 arrepia:


Imagine nadar continuamente por quinze horas. Quinze horas na dura e fria água do oceano. Quinze horas inconscientemente fazendo a mesma braçada que você tem feito desde os 10 anos. Você não pode ouvir por causa da touca, e não pode ver por causa dos óculos de nadar embaçados. Não pode pensar, porque a mente humana não esta programada para se concentrar por um período longo de tempo, então seus pensamentos derivam para o delírio e, logo, o tempo está mais distorcido do que nunca. Até onde você sabe, está no meio do nada, e qualquer esforço que produza para uma nova braçada não necessariamente o deixara mais perto da meta, porque a maior parte do tempo você não pode lembrar qual é a meta. Esta claro que sua provação não tem fim, a há uma única coisa que de algum modo você sente – que a escolha de abandonar a luta e subir a bordo do barco estilhaçaria seu orgulho de modo irreparável. Sobreviver é manter a dignidade intacta.”


Em dois de setembro Diana novamente entrou no oceano para alcançar seu desafio, e depois de dois dias e duas noite ininterruptos dentro d’água, ela conseguiu!
A história de Diana Nyad encoraja, estimula e serve de exemplo. Ao longo de sua preparação, a nadadora conseguiu vários fãs, curiosos que questionavam sua bravura. Enquanto uma parte apoiava a causa, outra a chamava de louca. No fim, eram muitos os encorajadores e poucos os pessimistas. Diana virou uma vitrine que ela mesma buscou construir.
Eis o ponto em que quero chegar! Para fazer a travessia, Diana sabia que precisava de uma equipe de profissionais sérios e que acreditassem nela. Então buscou os recursos que precisava, e claro, patrocinadores. A marca de desodorante feminino Secret, da Procter & Gamble, acreditou no potencial de Diana e bancou a aventura. Mais do que isso, a marca colocou Diana ainda mais na mídia, criou uma onda de mobilização e muita expectativa quanto a travessia. O canal de televisão CNN acompanhava as tentativas ao vivo. Quando conseguiu, Diana virou celebridade, foi chamada para todos os programas de tevê, não parou de dar entrevistas e ganhou status de lenda. Em todas as suas aparições, junto estava o pequeno emblema de Secret e carrilhões de mídia espontânea e buzz marketing gerados sem custo algum.
Então voltamos à pergunta do título: qual é a verba de um sonho? Acredito que toda a equipe e equipamentos de Diana não tenham saído barato, também acredito que a visibilidade gerada pela nadadora tenha pagado tranquilamente essa conta, como também sei que o risco de não dar certo foi muitas vezes questionado pela equipe de marketing de Secret. Acontece que o objetivo principal desse investimento não deve ter sido (ou não deveria) a visibilidade na mídia, mas sim ligar a marca em questão à causa de Diana, que com a repercussão gerada, acabou virando uma causa generalidade. Afinal, quem não tem sonhos e faria de tudo para alcançá-los?
Secret é uma marca desconhecida do público brasileiro, mas de muita tradição nos EUA. Esta no mercado desde 1957 e sempre colocou a mulher como protagonista em suas propagandas, destacando-as pelo slogan “uma vida sem medos” (life fearlessly). Ao longo dos anos, Secret acompanhou também a trajetória das mulheres, que cada vez mais vem alcançando seu lugar na sociedade. Diana também virou um exemplo da determinação feminista, de superação, de acreditar em si e de não ter medos! Um encaixe perfeito aos princípios de Secret! Durante toda a jornada, a expressão #fearlessnyad estava presente em todas as chamadas de Secret e da equipe de Diana, junto a #XtremeDream, nome dado ao projeto.
No fim, além de todas as aparições gratuitas, Secret se apresentou para suas consumidoras como uma marca que acredita no sonho das pessoas e aposta alto nisso. Isso gera empatia, admiração, reconhecimento e claro, mais lucro para o caixa!
No entanto questiono se a mesma Secret, aceitaria patrocinar Diana em sua primeira tentativa, em 1978. Acredito que não! Naquele tempo, empresas não tinham essa visão para com o consumidor, assim como o mercado e os próprios consumidores não relacionavam (não tanto como agora) marcas com valores. Na era da comunicação e da tecnologia, talvez o que mais falte para as empresas é justamente olhar mais para o lado humano de seus clientes, e não vê-los como portadores de um cartão de crédito, mas sim como carregadores de sonhos, assim como os de Diana. 
Há várias formas de conquistar a fidelidade de um cliente, assim como há várias marcas no mercado com praticamente a mesma qualidade e o mesmo preço. O consumidor hoje compra o que condiz com a sua necessidade e com a sua personalidade. Investir em uma personalidade que passou a vida inteira perseguindo um sonho não te inspira?




Palestra de Diana no TED em outubro de 2011

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