Pular para o conteúdo principal

After Life





Em tempos de acúmulo de conteúdo, séries com durações menores de tempo vem surgindo e ganhando espaço nos catálogos dos principais serviços de streaming. No início olhei esse movimento com desconfiança. Uma nítida adaptação focada em trazer público com certeza resultaria na diminuição da qualidade do conteúdo.
Bom, não é o que vem acontecendo. E refletindo melhor, seria um movimento natural do entretenimento e do nosso mundo atual. Até porque a própria qualidade vinha sendo questionada nas tradicionais séries de 10 capítulos, todos de 45 minutos, justamente por estender a história para esta “caber” no formato tradicional.
Era um modo de pensar antigo. Mesmo com o streaming quebrando a dependência de uma programação, o modelo episódico e temporal ainda era seguido. Nesse novo momento, percebido que essa dependência poderia ser estendida a outras instâncias, a criatividade de roteiristas e produtores novamente floresceu. Os episódios não precisam necessariamente ter o mesmo tempo, as temporadas não precisam ter um número exato de 10, 15 ou 20 por temporada e finalmente, trabalhos independentes podem ganhar mais espaços.



A série

E aqui chegamos a After Life, novo trabalho de Ricky Gervais, que escreve, dirige e protagoniza a série que possui seis episódios com duração média de 30 minutos. A série conta com o humor ácido de Gervais, mas trabalha muito bem o drama ao contar a história de Tony, um jornalista que perde sua esposa em decorrência de um câncer de mama e não vive um momento de luto e depressão onde não consegue superar a perda.
Mesmo tocando em assuntos pesados, a série ainda pode ser considerada uma comédia. Porém o texto de Gervais flutua muito bem entre cenas de puro humor, como as visitas de Tony as casas dos moradores da pequena cidade registrando as pautas por eles sugeridas, até os momentos de solidão do protagonista e na sua luta contra a depressão e busca (ou não) por um novo sentido para sua vida.
Essa mistura é o tesouro que After Life dispõe para seu público. Um passeio entre os sentimentos de dor e desalento de Tony à simplicidade e generosidade de seus colegas de trabalho e demais personagens que surgem na história. O olhar empático de Gervais é perspicaz principalmente na sua visão aos demais moradores da cidade. O carteiro, o drogado, a prostituta, são vistos com um olhar muito humano e natural. É este olhar o que mais traz reflexões a trama, como por exemplo sobre qual o nosso papel dentro do mundo, porque estamos aqui, qual o sentido da vida, porque temos que ser bons ou aonde isso vai nos levar.
After Life é um belo exercício de humanidade raro nos dias de hoje, engraçado, comovente, forte e excelente tecnicamente. Tudo isso em seis episódios de trinta minutos.
Ah, e sim, dá pra rir e pensar ao mesmo tempo.

PS: A trilha sonora da série é um assunto à parte. Prepare-se para assistir todos os créditos até o final.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Metaverso

Como a empresa de Mark Zuckerberg visualiza o nosso futuro No último dia 28 o Facebook comunicou a mudança do nome da empresa, passando de Facebook Company Inc. (proprietária, além do Facebook, do Instagram e WhastApp) para Meta Platforms Inc. Muito foi dito sobre os motivos que levaram a mudança, desde criar uma cortina de fumaça para os escândalos divulgados por Frances Hauges e intitulado Facebook Papers (link: https://www.cnnbrasil.com.br/business/facebook-papers-veja-o-que-os-documentos-vazados-revelam-ate-agora/) até uma clara desassimilação da empresa Facebook com a rede social de mesmo nome, que vem perdendo popularidade a cada dia, especialmente com os mais jovens. Ambos são assuntos que renderiam discussões à parte, mas aqui pretendo focar no conceito de metaverso, que há meses vem sendo difundido massivamente pelo Facebook e que Mark Zuckerberg aposta todas as suas fichas para construir seu novo império. O que é metaverso? Segundo a descrição do site Techtudo , “o metaverso ...

O amor é a flor da pele e eterno!

“Antigamente, se alguém tivesse um segredo que não quisesse partilhar, subiam uma montanha, procuravam uma árvore, abriam um buraco nela e sussurravam o segredo para dentro do buraco. Por fim, cobriam-o de lama e lá deixavam o segredo para sempre” A frase acima é dita por Chow Mo-Wang a seu amigo Ping, no filme Amor à Flor da Pele (2000), do diretor chinês Wong Kar-Wai, em uma das histórias de amor mais bem contadas do cinema, segundo muitos críticos. Kar-Wai consegue em seu filme dedicar ao amor a tradução que talvez mais o represente: a eternidade, ou o popularmente, até que a morte nos separe. Na história, conhecemos sr. Chow e a srta. Li-zhen Chan, os dois se mudam para Hong Kong da década de 60 com seus respectivos cônjuges no mesmo dia, onde ocupam quartos vizinhos de um mesmo edifício. Em comum, além do lugar onde vivem, os dois tem a ausência total dos parceiros, e posteriormente uma descoberta: seus cônjuges estão tendo um caso entre si. A descoberta aproxi...

Divertida Mente (Inside Out) é uma viagem fantástica rumo ao autoconhecimento

O primeiro filme da Pixar, Toy Story, completa 20 anos esse ano. Toy Story foi mais do que o primeiro filme produzido em computação gráfica do cinema, a história de Woody e Buzz Lightyear representou a entrada da Pixar no segmento de animação e uma revolução no modo de fazer desenhos. Em vinte anos foram quinze filmes produzidos. Nenhum deles pode ser considerado um filme ruim, e no mínimo três deles, obras primas. E Inside Out, ou Divertida Mente no título em português, é um deles. A Pixar conseguiu criar um padrão tão alto de qualidade que qualquer filme mediano produzido por eles pode ser considerado um Dreamwor..., digo, um trabalho ruim. O estúdio reúne sete Oscars de melhor animação em nove disputados, sendo que em duas oportunidades disputou na categoria de melhor filme - Up! e Toy Story 3.                 Divertida Mente segue a linha dos filmes citados. É Pixar em sua melhor forma, abusand...