Star Wars, novos tempos e o fracasso:
Cinco lições que fazem de Os Últimos Jedi um filmaço
Star Wars episódio VIII: Os Últimos Jedi já estreou faz quase
um mês, segue em cartaz nos cinemas e segue gerando polêmicas e discussões. Provavelmente
já recebeu o título de filme mais polêmico de toda a franquia, e isso é um bom
sinal. Primeiro porque os principais pontos de discussão acabam sendo a maior
força do filme e segundo que por trás de apenas um episódio, Os Últimos Jedi
carregam uma força que pode mudar a nossa visão do cinema americano.
Desde que a Disney comprou a Lucas Films e divulgou a
produção de um filme por ano do universo Star Wars, bem como a sequência da
trilogia original, com os episódios VII, VIII e IX, os medos e dúvidas de como
esta história seria contada causaram remorsos principalmente nos fãs mais
apaixonados.
No episódio VII, O Despertar da Força, lançado em 2015, o
diretor J. J. Abrams recria o universo da série com uma receita perfeita. Se
utiliza dos personagens principais da trilogia clássica e acrescenta novos
protagonistas e antagonistas junto a trama. O resultado é uma mistura entre o
novo Star Wars e o velho, e que dá muito certo. O Despertar da Força foi um
sucesso de público e crítica e conseguiu estabelecer uma excelente base para os
próximos dois filmes. Referente as críticas negativas, a mais direcionada a
este filme dizia que era “mais do mesmo”, e que o arco dramático dos filmes
originais se repetia aqui, somente com o acréscimo de novos personagens. Pois
bem, eis que chegamos a Os Últimos Jedi.
O legado que O Despertar da Força deixou foi a apresentação
dos novos personagens, o resgate dos antigos heróis e a definição de um novo
universo, onde a Aliança Rebelde luta contra as tentativas de domínio ditatorial
da Primeira Ordem. Dados este cenário, o oitavo episódio, que tem a direção de
Rian Johnson, busca agora estabelecer um novo momento para Star Wars, e aí vem
a visão, a coragem e também o respeito do diretor para com o legado da franquia.
SPOILERS
1- A
Transição entre o novo e o velho
Os Últimos Jedi mostra a transição do velho para o novo, e o
quanto isso é difícil. Se para o novo tudo tem que ser imediato, combatido
logo, de qualquer maneira e do seu jeito, o velho carrega consigo a experiência,
a paciência e o consenso. A lição aqui não é encontrar quem está certo ou quem está
errado, mas da necessidade de os dois se compreenderem. Do novo entender a
importância do velho e do velho saber o real momento de “sair de cena”. Este
entrave fica muito claro dentro da nave da república entre o capitão Poe Dameron
(Oscar Iscaac) e a vice-almirante Holdo (Laura Dern). Ambos têm o mesmo objetivo,
mas cada um tem sua forma de alcanca-lo. Existe certo ou errado dentre dessa
disputa? Não, ambos estão certos ambos estão errados. E aqui entramos no
segundo ponto do filme: todos em Star Wars erram.
2 – “O
fracasso, melhor professor é”
A frase acima, dita por Yoda (Frank Oz) talvez seja a que
mais represente o capítulo. Tudo e todos falham em Os Últimos Jedi. A cena de
abertura de Poe, mesmo que vencida, deixa os rebeldes sem defesa, a tentativa
de Rey (Daisy Ridley) de convencer Luke (Mark Hamill) é fracassada, o plano
dela de conversar Kylo Ren (Adam Driver) fracasssa, Kylo Ren fracassa contra
Luke, que descobrimos, já fracassou no passado com o mesmo. Até mesmo Leia
(Carrie Fischer) fracassa na tentativa de chamar outros rebeldes da galáxia. Inclusive
o plano e Paul, Finn (John Boyega) e Rose (Kelly Marie Tran), que entendo ser
um dos arcos mais problemáticos do filme, se olhado por essa lógica, torna-se
mais interessante. A principal crítica a este arco é que ele se estende demais
e acaba não indo a lugar nenhum, inclusive, atrapalhando o desenrolar da trama
principal e os próprios planos da Resistência. Eu discordo. Não me atrapalha o
desfecho não dar em nada se a jornada me agrada. E ela é encantadora. Finn e
Rose despertam a esperança e um futuro que estava sem esperança e acabam
percebendo que a luta entre o bem e o mal tem outros protagonistas.
3- O fim do bem contra o mal
O nosso mundo é muito complexo, e enxergar simplesmente pela
ótica do certo e errado é simplista demais, para não dizer ignorante. No
entanto essa visão – ainda - dá certo na
ficção. Desde as fábulas infantis, onde o Lobo Mau (Mal) come a vovozinha (Bem),
passando pelo próprio cinema até propriamente Star Wars, onde o lado negro da
força tenta dominar os mocinhos. Essa visão dualista, de que existe nós e eles
é prejudicial e gera barreiras. Parece que eles não são nós. E eles não sendo
nós, estão 100% errados e é meu dever convencê-los a qualquer custo a mudar de
opinião. Star Wars personificou essa luta com Darth Vader e Luke Skywalker. Era
Yin versus Yang. Agora não mais.
4- Vilões
não são a personificação do mal
E provavelmente por isso, que o personagem de Kylo Ren não
tenha ainda caído nas graças do público. Kylo foi concebido para ser o
substituto de Darth Vader. Inclusive em o Despertar da Força carregada um
capacete muito similar a ele. No entanto Kylo é inseguro, tem fraquezas, medos
e sofre. “Como assim, esse moleque fraco quer se comparar ao poderoso e
inigualável Vader? Nunca será!”, diriam alguns. Acontecem que somos acostumados
novamente a uma visão dualista de mundo. Ou é ou não é! Inclusive Rey tenta
convencer Kylo a “mudar de lado”, porque vê que ele não está 100% corrompido.
Da mesma forma Kylo tenta convencer Rey ao ver que ela tem um pouco do lado negro
dentro de sí. E isso é tão obvio que pode até ser colocado como uma falha de
roteiro. É claro que ambos possuem um pouco de bom e de ruim dentro de si. Não
só eles como todos nós. Esperar que alguém tenha uma personalidade única,
incorruptível e intransmutável é ficção, não se aplica as regras humanas. E o que esse novo Star Wars faz é trazer a
franquia para mais perto de nós, e mais longe do que idealizamos para nós
mesmos.
5 – Heróis
tem defeitos
Outro exemplo disso é Luke Skywalker e seu destino. O herói sem
precedentes da franquia original agora pode ser lido como um covarde que se
refugiou em uma ilha, abrindo mão de seu legado. Não é a leitura que fiz, mas
se fosse, isso o torna menos herói? Se Kylo Ren é um vilão com fraquezas, Luke
aqui faz o contraponto, e se mostra como um herói também com medos e
incertezas. Seu principal vilão aqui é o medo de falhar, de repetir erros do
passado, ou então de não começar novos. Com isso ele se refugia, se esconde do
mundo e da própria Força.
Não é só em uma vez que Luke desaponta seus fãs mais
antigos, que o viam como um grande herói. Sua cena inicial é uma amostra do que
está por vir, que se confirma em seu discurso, ao dizer que “os Jedi foram
egoístas ao se dizerem ‘donos’ da Força”. E é curioso perceber que mesmo
transparecendo todas as suas fraquezas, ele nunca deixa de ser poderoso. Sua
cena final é espetacular, talvez o melhor momento de toda a franquia e seu fim
não deixa de ser uma homenagem a seu legado. No fim Luke cumpre sua função de
lenda. E se em Star Wars Episódio IV, é ele a última esperança em quem a
República confia, aqui, ele - sua lenda - torna-se novamente uma esperança para
o novo futuro deste universo.
6 - A Força
é para todos
Para Luke, não são então os Jedi que precisam acabar, mas a
ideia de que a Força é apenas para privilegiados, de que só existe um jeito de
saber controlá-la. Yoda vai além, queima os livros sagrados dos Jedi aos risos.
Aqui não existe mais uma ordem a ser seguida, não é necessário ter um sobrenome
para dominar a Força ou passar por um treinamento. A Força está entre nós, ela
não é propriedade de ninguém, e saber utilizá-la vai de cada um. Rey representa
isso. Dona de um poder impressionante, sua jornada é em busca de si mesma. E
para encontrar-se, ele entende que precisa visitar seu passado. Porém, ao
finalmente encontrá-lo, percebe que este não existe. Rey veio de lugar nenhum e
é filha de ninguém. Foi trocada por lixo pelos seus pais. A Força que encontrou
vem dela mesma, não é herança de ninguém.
5 - O equilíbrio
é a resposta
Por fim, talvez a principal resposta que Os Últimos Jedi
traz. Na trilogia clássica éramos movidos pela luta entre o bem o mal, entre os
Jedi e os Sith, como se uma coisa fosse totalmente diferente da outra. Sendo
assim, como a escuridão é a ausência de luz, entende-se que o mal é a ausência
do bem, e a partir disso, quem é mal, tem consigo a ausência do bem. A questão
aqui é que se tudo fosse analisado sobre esta ótica, estaríamos presenciando
uma guerra infinita. Ora, se “eles” tem ausência de bem, porque insistir em uma
aproximação?
Esses dias li que o que nos fez a civilização que somos hoje
foi justamente os pontos em que discordamos. O discordar leva a
questionamentos, que leva ao debate, as provas, as evidências que gera o
crescimento. Se concordássemos em tudo, não teríamos o que buscar a mais. Ou
seja, as nossas diferenças nos engrandecem, mas também nos prejudicam.
Encontrar o equilíbrio nessa discussão e, principalmente, ver o outro lado como
maior empatia, é um bom caminho.
É o que Rey buscou ao mergulhar no dark side. Isso não
significou que ela fosse mais cedente ao lado negro ou não, ela precisou
descobrir. E justamente esse foi o maior medo de Luke. Ele já havia passado
duas vezes por essa tentação. Ao acreditar que Vader poderia mudar de lado e ao
notar que havia perdido Kylo. O que Luke não percebeu é que o mudar de lado é
novamente ver o mundo com dualidade. Essa barreira entre nós e eles é o oposto
do equilíbrio buscando por Rey. Ela parece perceber que pode mergulhar nesses
dois lados e encontrar algo diferente, que em sintonia com o que ela tem consigo
construirá sua própria jornada.
Uma análise muito bem feita, até agora não tinha visto alguém comentar sobre o fato de todos os personagens falharem no filme e isso servir de lição. Bem inteligente da sua parte. Na minha opinião o filme ganha um 7/10, por ter fugido um pouco do ep V mas perdeu pontos pela repetição de coisas que não deram certo. DJ é um personagem esquecível e Snoke morre de maneira que é até emocionante na hora mas depois você vê que não sabíamos nada sobre ele e ele morreu mesmo assim.
ResponderExcluirOpa Luigi, obrigado pelo comentário!
ExcluirConcordo quanto ao Snoke, um vilão muito bem construído no ep VII e se perde aqui. E quanto ao DJ acredito que o Del Toro quis aparecer mais que o personagem. Aquelas cacoetes foram horríveis.
Pela coragem do roteiro e aquele ato final apoteótico não consigo dar menos que um 9/10. Para mim, o segundo melhor filme da franquia.